Fecha os olhos e imagina um rapaz com sede pelo mundo, à procura da humanidade nas pessoas e na simplicidade da natureza. Agora abre e lê este Solo Adventurer que te trago, o nosso Jonny. De raízes portuguesas e espanholas, com história de judeus e terror nazi à mistura mas pautado pela paixão por saber quem é. Uma paixão pela natureza que move montanhas. Hoje trago-te aquilo que tu sempre quiseste saber que existia, uma pessoa que não tem medo dos verbos ser, sentir e partir. As suas lições de vida trazem muito contexto com cenários pelos quais passou, sei que não te vai desapontar porque ele nada deve ou teme. É bom conhecer quem sabe que está no (seu) caminho certo.
-Sinopse de uma amizade-
Conheci o Jonny num auditório repleto de novas caras, para ser mais precisa cerca de 80 pessoas de vários pontos do país que iniciavam juntos uma nova aventura no caminho da liderança servidora Ubuntu (sobre isso falarei contigo mais tarde). Sou de memória fotográfica e para nomes preciso de mais treino, mas recordo-me que este rapaz, até àquele momento meu desconhecido, se sentou na fila à minha frente com sibilante simpático, sorridente, de pessoa que dá e não pede em troca. Mal eu sabia quem era o Jonny, nem ele me havia de saber.
-Sinopse sobre o Jonny-
Nascido em Madrid, emprestado já quase dado a Portugal, percorreu meio mundo de braços e olhos bem abertos. A Oceania já foi a sua casa durante 18 meses, especificamente a Austrália, mas há dois anos que Lisboa lhe tem sido novo abrigo.
A escolha pelo nosso país não foi ao calhas, tem pai português que aos 15 anos foi embora e aos 18 assentou em Espanha. A sua mãe é espanhola e dentro de casa tanto de um lado como de outro o espanhol foi sempre a língua de eleição, contudo quem um dia ouvir o Jonny ficará encantado pela sua desenvoltura no português.
Apesar de férias pontuais no Verão português, Jonny e os seus irmãos nunca sentiram uma influência verdadeiramente portuguesa na sua família, mas ao que parece o coração tem razões que a própria razão desconhece. Por falar em irmãos, tem dois mais velhos um a morar em Nova Iorque e outra em Barcelona. Pelos vistos o mundo está-lhes no sangue.
Em 2016 foi um ano marcante na sua vida, atravessava uma crise - das que todos passamos de tempos em tempos nas nossas vidas e que nos enchem a cabeça de questões. Nesse ano decidiu querer sair de Madrid e acabou por fazer uma viagem de bicicleta pelos Açores em São Miguel, o que lhe desencadeou a coragem necessária para tomar decisões e não adiar mudanças que sonhava. Veio então passar uns dias por Lisboa e numa conversa com o seu avô paterno lisboeta e a sua irmã, decidiu ficar para se conectar com as suas raízes portuguesas, a língua e aventurar-se na tentativa de abrir um hostel. Se hoje tem o negócio? A vida dá muitas voltas e algumas funcionam como arranque... decidiu-se no caminho da Psicologia (um desejo que já tinha e que no seu passado não deu).
Estamos em 2018 e o Jonny vai ingressar já no seu segundo ano de licenciatura. Por enquanto também preenche os seus dias trabalhando num bar/café no Largo de Intendente, mas diz que tem adiado há muito a sua transição para fora de trabalhos de restauração para ir noutras aventuras profissionais.
Mais sobre ele? Deixo pelas suas palavras porque quando as me enviou achei que estavam atabalhoadamente honestas e nos fazem sentir quem é, tornando-o numa fonte de inspiração (mais que não seja pelas decisões que o levaram ao que é hoje).
"Sobre mim, posso comer qualquer coisa no mundo, não há nada do que não goste. Adoro andar de bicicleta, fazer campismo ou passar muito tempo na água gelada do Atlântico. Entre os meus bisavós e os meus irmãos há seis nacionalidades diferentes. Os membros da minha família moram cada um numa cidade diferente. Não sei poupar dinheiro e há cinco anos que tenho como resolução de ano novo tirar a carta. Detesto a falta de humildade, e quando era novo detestava os meus caracóis, hoje compreendo que fazem parte de mim. Tenho as pernas cheias de feridas, elas também contam histórias."
Quando me enviou as suas lições de vida estava de partida para a missão Ubuntu na Grécia junto dos refugiados. Certamente regressou com mais lições de humildade no bolso e coração.
-Lições de Vida na primeira pessoa-
do Jonny para nós
Caminhar na natureza é necessário
Caminhar é a virtude mais básica do ser humano, no entanto, essa virtude cada vez mais está a ser um obstáculo na sociedade dos y . Apercebi-me da necessidade de caminhar no Nepal, quando fazia uma rota de vinte dias sozinho nos Himalaias. Lá, não tinha mais nada para utilizar além das minhas pernas. Reparei que nessas 7 ou 8 horas diárias que caminhava estava a utilizar o tempo para mim. Para reflectir, para analisar, para me introduzir no meu próprio mundo tantas vezes esquecido na rotina. Porquê é que nos esquecemos de nos próprios? É bem simples: estamos rodeados de distracções, do amigo que quer estar connosco, da música que nos apetece ouvir, da televisão, do trabalho, dos estudo... E nós? Onde ficam as nossas preocupações, o nosso saber aproveitar o momento presente, e não só, onde fica o sabermos valorizar aquilo que temos à volta? É preciso caminhar, caminhar é como um motor que acende o nosso self interior e nos traz visões esclarecidas do que se está a passar. Caminhar num meio natural, sem carros, sem barulhos, sem estímulos mais do que aqueles que a natureza nos dá. Aproveitar o silêncio para tomarmos melhores decisões e reflectirmos sobre situações passadas. É preciso caminhar na natureza, pelo menos uma vez de quando em quando.
2. Nasci numa família judaica na capital de Espanha. Sou filho dum português que sempre falou comigo espanhol e não se considera nem português nem espanhol, mas sim judeu. Os meus bisavós fugiram da Polónia e do terror nazi. Eu não tenho apelidos espanhóis, nem raízes em Espanha, mas também não tenho apelido português nem um enraizamento em Portugal. O meu apelido é Israel, nome da terra da que deveria estar orgulhoso como judeu. Mas não estou. Não sinto orgulho por Israel, nem por Espanha, nem por Portugal. Nesta mistura cultural surgiu uma rejeição às bandeiras, assim como às etiquetas e, portanto, uma rejeição à ideia de que a identidade depende do lugar onde nascemos ou somos criados. Eu sou tudo aquilo que tenho vivido, as experiências que tive e que me foram moldando, o que às pessoas a minha volta fizeram de mim e o que eu próprio fui aprendendo. Nesta soma há uma parte do país onde cresci e fui educado, claro, mas a minha identidade é uma mistura de isso tudo, que faz de mim quem eu sou, a minha identidade.
3. Em 2014 tive a sorte de fazer uma viagem de bicicleta na ilha de Tasmânia, Austrália. Fui com um grande amigo meu mais experiente do que eu, com quem combinei uma viagem dura, pelas montanhas mais difíceis de ultrapassar. Da primeira vez que subimos uma montanha achava que me ia ser impossível completar a viagem. Não me via capaz de a fazer. O segundo dia sofri um bocadinho menos, e o terceiro dia não sofri. Foi então que compreendi que a chave não estava nas minhas pernas, mas sim na minha cabeça. Uma subida de bicicleta pode tornar-se mesmo frustrante se formos vencidos pela mente, mas se conseguirmos controlá-la, a subida torna-se numa relação natureza-corpo, onde não há lugar para o sofrimento, mas sim para a harmonia e o silêncio. Onde cada latido do coração se ouve. A paciência tem que governar a batalha e quando os pensamentos negativos chegam têm que desaparecer logo, focando-nos no nosso corpo, e ouvindo os sons a nossa volta, desfrutando da paisagem ou lembrando cenas do passado. O tempo perde sentido e todos os problemas da vida também. És tu a o meio, e passadas três horas chegas ao cume…e reparas: consegui-o. À noite entras na tenda no meio da floresta, dormes no chão, e pensas: se fiz isto, o quê há na vida que não possa fazer?
4. Andava pela ilha de Samoa, no Pacífico Sul, com uma mountain bike que tinha alugado para percorrer a ilha toda durante algumas semanas. Samoa é uma ilha paradisíaca e os samoanos têm a bondade dentro deles. No entanto, naquela primeira jornada de bicicleta pela ilha, não me senti muito à vontade. Passava pelas aldeias onde eles mantinham o seu modo de vida e sentia-me como um intruso ao receber o olhar desafiante dos habitantes. Foi quando decidi ser eu a cumprimentar e a sorrir que mudou a minha percepção, e esse “olhar desafiante” tornou-se num olhar de bem-vinda. Nem todas as pessoas recebiam o meu sorriso e o meu (olá em samoano) de forma positiva, mas a maioria deles mudavam essa expressão de zanga que muitos samoanos têm por uma expressão amável, carinhosa, que me fazia sentir mesmo seguro. Aprendi, nessa primeira aventura que realizei, há já cinco anos, que a nossa atitude pode mudar muito. E o sorriso tira a desconfiança, o medo e quebra as barreiras que nos separam. Aprendi isso na ilha de Samoa, e depois me fez sentido em todos os países que visitei onde havia uma mudança cultural, mas sobretudo, faz-me sentido no meu dia a dia, com as pessoas que me relaciono ou que simplesmente troco umas palavras. E de facto, muda muito as coisas.
5. Vivemos numa sociedade onde nos dizem que devemos escolher o que queremos “ser” logo desde crianças e aos 18 anos escolher a profissão que marcará a nossa vida. Eu tive algumas dificuldades com os estudos. Não sabia o que queria e a desmotivação criada pelo sistema fazia com que nem quisesse estudar. Aos 20 anos tive a oportunidade de entrar na faculdade, facto que pensei nunca vir acontecer. No entanto, nesse mesmo ano, surgiu-me uma oportunidade totalmente diferente: ir para a Austrália. Nesse tempo de indecisão entre estudar uma licenciatura qualquer ou viajar e ver mundo, muitas pessoas diziam-me “o primeiro são os estudos”. Ainda bem, os meus familiares mais próximos encorajaram-me para tentar a aventura. Na Austrália não só aprendi uma língua, viajei a ilhas perdidas no mapa ou ganhei experiência laboral. Na Austrália arranjei também uma filosofia de vida que tem caminhado comigo nos últimos cinco anos. A mudança de vida ensinou-me a ver o mundo com outros olhos e a conhecer-me melhor. Por isso, aos 25 anos, após ter-me mudado para Portugal, soube que o momento para me assentar e estudar, tinha chegado. Há pouco completei o primeiro ano de Psicologia com o entusiasmo de quem sabe que está no caminho certo, e esse caminho começou a fazer-se no momento que decidi não ir para a faculdade.
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Boas Aventuras,
Solo Adventurers Joana & Jonny
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